sábado, 29 de outubro de 2011

DEUS VÊ NOSSO INTERIOR


Reflexão Para XXXI Domingo Do Ano Litúrgico A

(30/10/2011)

Texto de Leitura: Mt 23,1-12

Depois que instruiu os seus discípulos sobre seu destino e sobre as exigências do seguimento (Mt 16,21-20,34), Jesus entrou em Jerusalém onde ele começou a encarar os dirigentes religiosos de Israel e sofreu a humilhação da parte deles (Mt 21,1-23,39). A oposição está em torno da messianidade de Jesus. Jesus se manifesta como Messias através de três gestos simbólicos: a entrada triunfal de Jesus em Jerusalém onde ele é saudado como rei, Filho de Davi (Mt 21,1-11); a expulsão dos vendedores do Templo (Mt 21,12-13) e a maldição sobre a figueira que não dá fruto (Mt 21,18-22). Apesar de tudo os seus adversários questionam a autoridade de Jesus (Mt 21,23-27) e procuram algum motivo para condená-lo (Mt 22,15-40). A resposta de Jesus diante desse desprezo encontra-se, explicitamente, em Mt 23,1-39, onde se encontra o texto do evangelho lido neste dia. Essa oposição acontecerá entre a comunidade de Mateus e o judaísmo quando a ruptura entre ambos já tinha acontecido.

O texto do evangelho lido neste dia começa com a constatação de que os escribas e os fariseus ocupam a cátedra de Moisés: “Os escribas e os fariseus estão sentados na cátedra de Moisés” (Mt 23,2). A expressão “Cátedra de Moisés” indica a autoridade de Moisés de proclamar e interpretar a lei. Depois da destruição do Templo (nos anos 70), o poder de ensinar e de interpretar a Lei (Torah) passou realmente para as mãos dos doutores da lei, principalmente daqueles que pertencem à escola dos fariseus.


A comunidade cristã primitiva aceitava a autoridade dos escribas: “Fazei e observai tudo quanto vos disseram” (Mt 23,3ª). Mas logo os discípulos são advertidos contra a falta de veracidade desses doutores: “Não imiteis as suas ações, pois dizem, mas não fazem” (Mt 23,3b). Sem dúvida nenhuma a autoridade dos escribas é legítima, sua interpretação da Lei (Torah) deve ser seguida, mas não imitem o que fazem, pois seu procedimento não corresponde aos seus ensinamentos. Com isso, Mateus quer nos mostrar que o que separa a comunidade cristã da sinagoga não é a doutrina e sim a vivência dessa doutrina.

O capítulo 23 do Evangelho de Mateus é o mais violento do Novo Testamento. Quem o lê fica impressionado, sobretudo, com a linguagem dura de Jesus. Estes ataques completam a obra dos profetas contra a falsa religiosidade. As palavras são duras porque o perigo que é denunciado é grave. E a validade da denúncia profética que ouvimos dos lábios de Jesus, neste capítulo, não perde sua atualidade, pois seu alcance é universal. O “fariseu” a quem Jesus dirige suas palavras duras e a denúncia é personagem típico, representa um paradigma de comportamento oposto ao Evangelho.


O Evangelho de hoje não pretende estimular ninguém a maldizer os fariseus que já faleceram há mais de dois mil anos, e sim provocar a reflexão para verificar se os “fariseus” ainda estão bem vivos hoje dentro de nós ou entre nós.

Como descobrir se somos “fariseus”?  Basta verificar o texto do Evangelho de hoje para descobrir as suas características e conferir se por acaso elas se encontram dentro de nós e entre nós.

1. A hipocrisia: “Dizem e não fazem”.

A palavra hipócrita designava no mundo grego antigo o ator que, com uma máscara e um disfarce, assumia uma personalidade alheia. Fingia diante do público ser outra pessoa freqüentemente sem nada a ver com a sua própria personalidade, porque trabalhava para a platéia. Ele não vivia sua própria identidade.
   

Segundo o Evangelho de hoje hipócrita é aquele que diz, mas não faz. É uma incoerência de vida. É uma duplicidade, um fingimento. Ele extremamente se apresenta como um homem religioso, alguém que faz questão de proferir palestras bonitas sobre o amor, sobre a paz, sobre o respeito para com os outros, mas ninguém o vê viver assim.

A hipocrisia, que tenta esconder atrás da fachada limpa a podridão interior, não convém ao cristão que é chamado a viver e proclamar publicamente a palavra recebida de Jesus. O Senhor quer que tenhamos diante d’Ele e diante dos outros uma única vida, sem disfarces e mentiras, pois n’Ele mesmo encontramos a plenitude da unidade de vida, a mais profunda união entre as palavras e as obras. A verdade é sempre um reflexo de Deus e deve ser tratada com muito respeito. Ao buscar sempre a verdade, fugindo da duplicidade, o cristão se torna uma pessoa honrada e respeitada. A falta de veracidade que se manifesta na mentira ou na hipocrisia ou na falta de unidade de vida, revela uma discórdia interior. Por isso, o Senhor diz no Sermão da Montanha: “Seja o vosso Sim, sim e o vosso Não, não. O que passa disso vem do Maligno” (Mt 5,37).

Se deixarmos crescer o medo de ser nós mesmos, acabaremos não sabendo quem nós somos. Nunca seremos autenticamente nós enquanto estivermos subordinados à opinião e às expectativas dos outros. A nossa riqueza consiste em que sejamos nós mesmos e não em que nos pareçamos com os outros ou com o que os outros esperam de nós. Os homens verdadeiros e autênticos podem ser aplaudidos ou condenados, amados ou odiados, mas sempre despertam nossa admiração.

2. Ele quer que o outro seja misericordioso para com ele enquanto ele mesmo é severo para o outro.

    
O Evangelho diz: “Amarram fardos pesados e os põem sobre os ombros dos homens, mas eles mesmos nem com um dedo se dispõem a movê-los” (v.4). “Amarrar” significa aqui “declarar obrigatório”. Os “fardos pesados” são uma alusão ao conjunto das Leis caracterizadas pelas exigências casuísticas que tornavam impossível a sua observância.  Para os outros, severidade e para eles, amenidades. No entanto, o fardo de Jesus não é pesado, pois ele é amor. O amor faz crescer, tranqüiliza e dá segurança (cf. Domingo anterior).

Quando temos entre as mãos os corações daqueles que queremos melhores e os sabemos atrair com a mansidão de Cristo, já percorremos metade do nosso caminho apostólico. Ao perceberem isto, os corações deles se tornam abertos, como terra boa, onde podemos semear a semente da Palavra de Deus.

Hoje em dia ainda existe alguém que tenta impor aos outros “cargas insuportáveis” das quais Jesus nunca falou. Não podemos esquecer nunca que somos homens que tratam com os outros homens, mesmo quando queremos fazer bem às almas. E existe sempre alguém que quer que os outros sejam misericordiosos e pacientes para com ele, mas ele mesmo não se mostra paciente e misericordioso para com os demais. Enquanto Jesus diz: “Tudo aquilo que quereis que os outros vos façam, fazei-o vós mesmos a eles...”(Mt 7,12).

3. Exibicionismo

Jesus critica o exibicionismo dos fariseus e dos mestres da Lei porque eles buscam todos os meios para serem notados e para serem reconhecida sua autoridade e seu prestígio; possuídos de sua superioridade, julgam-se dignos dos lugares de honra na vida civil e religiosa. Assim eles criam a desigualdade.

Na verdade, um exibicionista é uma pessoa de personalidade superficial, fútil e sem sólidos ideais. Ele vive mendigando louvores e os procura de todas as maneiras. Tudo o que ele faz é na perspectiva de algum louvor.

O exibicionismo deverá ser combatido com o espírito de simplicidade e humildade.

4. Gostam de ser chamados Mestre

Os títulos e os cargos podem confirmar a autoridade que nós temos, mas não nos dão a que não temos. Se nós queremos saber quanta autoridade temos, não nos perguntemos a quantos nos submetem, mas a quantos nós ajudamos a crescer. O medo que os outros têm de nós não mede nossa autoridade, mas nosso poder autoritário. Quando nós precisamos apelar para a força e para o poder para sermos autoritários é porque como pessoa já não temos mais autoridade.
      

O Senhor nos diz: “Todos vós sois irmãos” (v.8). O fundamento desta universal fraternidade já foi visto pelo profeta Malaquias que nos diz em forma de interrogação: “Não temos nós todos um mesmo Pai? Não nos criou um mesmo Deus ?“ (Ml 2,10). Então, há um laço que nos une a todos, laço de origem. Cada pessoa humana é fruto do amor pessoalíssimo de Deus e cada um é querido por Deus.
   

Portanto, antes de qualquer diferenciação entre os homens, seja de ordem pessoal (dotes) seja de ordem social (funções), vigora uma igualdade básica querida por Deus: todos irmãos. Fundamentalmente ninguém, por natureza, pode dominar o outro e colocar-se por cima dele. Nada mais danoso à fraternidade e ao encontro entre os homens do que a ostentação que quer diferenciar para dominar. Admitir a radical fraternidade implica tornar secundárias todas as distinções de cor, de classe, de religião etc. A fraternidade afasta para longe de qualquer convivência a tentação ao exibicionismo e à superioridade.

Por isso, perguntemo-nos: Será que vivemos como irmãos ou queremos ser superiores aos outros ?  No íntimo de cada um tem resposta!


P. Vitus Gustama,svd

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