domingo, 6 de janeiro de 2013

08 de Janeiro

TER COMPAIXÃO É ESTAR EM SINTONIA COM DEUS
         
 
Texto: Mc 6,34-44

Naquele tempo, 34Jesus viu uma numerosa multidão e teve compaixão, porque eram como ovelhas sem pastor. Começou, pois, a ensinar-lhes muitas coisas. 35Quando estava ficando tarde, os discípulos chegaram perto de Jesus e disseram: “Este lugar é deserto e já é tarde. 36Despede o povo para que possa ir aos campos e povoados vizinhos comprar alguma coisa para comer”. 37Mas Jesus respondeu: “Dai-lhes vós mesmos de comer”. Os discípulos perguntaram: “Queres que gastemos duzentos denários para comprar pão e dar-lhes de comer?” 38Jesus perguntou: “Quantos pães tendes? Ide ver”. Eles foram e responderam: “Cinco pães e dois peixes”. 39Então Jesus mandou que todos se sentassem na grama verde, formando grupos. 40E todos se sentaram, formando grupos de cem e de cinquenta pessoas. 41Depois Jesus pegou os cinco pães e dois peixes, ergueu os olhos para o céu, pronunciou a bênção, partiu os pães e ia dando aos discípulos, para que os distribuíssem. Dividiu entre todos também os dois peixes. 42Todos comeram, ficaram satisfeitos, 43e recolheram doze cestos cheios de pedaços de pão e também dos peixes. 44O número dos que comeram os pães era de cinco mil homens. 
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Com esta passagem o evangelista Marcos inaugura uma nova seção de seu evangelho. Nesta seção Marcos unifica tudo em torno do tema sobre o pão: das multiplicações dos pães (Mc 6,30-44; 8,1-10), discussão sobre o sentido das abluções antes de comer o pão e sobre o falso fermento (Mc 7,1-23; 8,11-20), discussão com uma pagã em torno das migalhas de pão que solicita (Mc 7,24-30). Por isso essa seção é chamada de “seção dos pães”.

 
A alimentação da multidão (multiplicação de pães) é o único milagre narrado em todos os quatro evangelhos (Mt 14,13-21; Mc 6,32-44; Lc 9,10-17; Jo 6,1-15) e o único narrado duas vezes (em duas versões variantes) em Mc (Mc 8,1-10) e em Mt (Mt 15,29-39). Obviamente o relato da multiplicação tem sua alusão a Ex 16, história do maná no deserto (aqui se diz no lugar deserto) e a 2Rs 4,42-44, Eliseu alimentou 100 pessoas com 20 pães e ainda sobraram.

 
Compadecer-se significa vestir-se dos “sentimentos” de Deus

          
O evangelista nos relatou que “Jesus viu uma numerosa multidão e teve compaixão porque eram como ovelhas sem pastor” (Mc 6,34). Aqui Jesus revela a “misericórdia”, o “amor”, a “fidelidade” de Deus ( as três palavras se resumem densamente numa palavra só: compadecer-se). Jesus se apresenta e se revela como o Pastor prometido que vem reunir as ovelhas (unir, reunir= salvar). Deus não abandona seu povo na sua luta de cada dia. Deus sempre se compadece.

 
A compaixão é uma atitude primordial de Deus. Por isso, quando se fala da compaixão, não se trata de um vago sentimento de comoção. O verbo usado nos Evangelhos (compadecer-se) é muito forte e quer dizer sentir-se perturbado nas entranhas. A compaixão, por isso, nos pede que vamos até onde existem feridas, que entremos em lugares onde existe o sofrimento, que compartilhemos os desânimos, os temores, as angústias dos nossos próximos. No Evangelho este verbo é usado exclusivamente em relação a Jesus ou a Deus. Por isso, quem tem compaixão, ele está em sintonia com Deus e está com Deus.

          
Esta profunda compaixão diante das necessidades dos nossos semelhantes é a primeira condição para nos sentirmos motivados para a ação. Quem permanece impassível, quem não alimenta os sentimentos de Cristo, muito dificilmente será induzido a fazer qualquer coisa pelo bem dos próximos. Por isso, quando der alguma ajuda, ele dá somente para obedecer a alguma imposição externa, a uma convenção social, e não por uma premente necessidade interior.


Partilha contra egoísmo

          
Os discípulos têm pena da multidão que está com fome, por um lado. Mas por outro lado, eles reconhecem a incapacidade de saciá-la com cinco pães apenas. Como resolver o problema? Eles aproximam-se de Jesus não para perguntar-lhe que planos tem, mas para oferecer-lhe uma “solução”: “Despede o povo, para que possa ir aos campos e povoados vizinhos comprar alguma coisa para comer ”(Mc 6,36). A solução oferecida pelos discípulos, então, é despedir para comprar. Em outras palavras, cada um tem que prover para si mesmo, por meio de dinheiro. Mas vem a pergunta: “Será que todo este povo tem dinheiro?”

          
Comprar e vender (pães) supõem orientar as relações sociais pelas leis da economia, onde impera a concentração de bens e a exploração; supõem submeter-se às leis econômicas que mantém essa multidão na miséria. Sabemos que onde há concentração de bens e alimentos, lá há sempre fome e miséria. Neste contexto, quem tem dinheiro, tem direito de comer; quem não o tem, torna-se vítima da fome. O que tem por trás disso é o egoísmo. E as pessoas contaminadas pelo egoísmo acabam virando as costas para o seu próximo em dificuldade.

          
A atitude que Jesus tem com a multidão faminta do pão e da palavra contrasta com a sugestão dos discípulos. A “comprar” Jesus opõe “dar” e ”repartir”: “Dai-lhes vós mesmos de comer” (Mc 6,37). Os discípulos só têm cinco pães e dois peixes. Cinco pães e dois peixes somam sete, o número que indica a totalidade. Aparentemente há pouco pão (cinco pães) para saciar tanta gente (mais de cinco mil pessoas). Somente aparentemente há pouco pão! Porque se cada ser humano tivesse amor e justiça, o pão não faltaria para ninguém. Para Jesus, o eterno problema da vida não é a falta do pão, e sim as causas que geram a falta do mesmo na mesa da grande maioria. O que se revela, além disso, não é a ausência do pão, e sim a presença do egoísmo, do individualismo, da ganância e da total ausência do amor fraterno.

          
“Dar” ou “repartir” os pães comporta uma dinâmica diferente. Jesus não nos revela os “truques” dos milagres, mas nos ensina a fazer bem tudo que não é milagre: pôr em comum o que temos e reparti-lo entre os irmãos. E tudo parte do amor ao semelhante cuja penúria ou miséria torna-se um apelo para a solidariedade e a partilha. Quem possui algo para comer, deixa-se tocar por quem não o tem e abre mão, generosamente, do que lhe pertence para saciar a fome do próximo. Esta atitude funda-se na pura gratuidade e exclui qualquer desejo de recompensa. Nessa direção é que os cristãos, todos nós, devem caminhar: partilhar, partilhar e partilhar, pois a partilha é a alma de todo projeto de Jesus Cristo.

          
Se a partilha e a compaixão são a atitude primordial de Deus, portanto repartir o pão significa prolongar a generosidade de Deus- criador: Ele criou tudo por amor e gratuitamente sem nenhum mérito de um ser humano.

Lutar pelo alimento é o mais elementar dos deveres dos homens. O pão é o símbolo de toda a alimentação. Com o milagre do Evangelho de hoje Jesus abre os nossos olhos para os compromissos que a eucaristia traz: somos responsáveis pela fome e a miséria dos nossos próximos. Entrar em comunhão com o Senhor na eucaristia exige fazer comunhão com aqueles que lutam na busca do pão necessário à vida. Assim vivida, a eucaristia torna-se para quem dela se alimenta, fonte de coragem e esforço permanente no compromisso com a concretização do reino de Deus através da partilha de tudo que se tem.

P. Vitus Gustama,svd

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