I
ADVENTO: O SENHOR VEM ME VISITAR. O QUE PRECISO FAZER?
Sabemos que,
civilmente, o ano
novo começa
no dia primeiro
de janeiro. Mas,
na liturgia, o ano
novo (um novo ano litúrgico) começa
no primeiro domingo
do Advento e termina no XXXIV domingo do Tempo
Comum, na festa
do Cristo, Rei
do Universo. Na liturgia,
há três anos:
o ano “A”, durante
o qual refletimos sobre
o evangelho de Mateus;
o ano “B”, o evangelho
de Marcos; e o ano
“C”, o evangelho de Lucas. O evangelho de João é refletido durante
as festas, como
no Natal, no tempo
da páscoa e em
alguns domingos
do Ano Marcos,
pois o evangelho
de Marcos é curto,
só tem 16 capítulos.
O termo
“Advento” significa “vinda” ou “chegada”. O “Advento”
indicava, na linguagem pagã, a vinda periódica
de Deus e sua
presença teofânica no templo.
Equivale a “retorno” ou “aniversário”.
Do ponto de vista
cristão, Advento
era a última
vinda do Senhor
no final dos tempos.
Mas, ao se instaurarem as festas do Natal
e da Epifania, o Advento
significou também a vinda
de Jesus na humildade da carne.
A partir
desse sentido, o Advento
é tempo de fé
na esperança, que
nos prepara
para a dupla vinda do Senhor: a vinda histórica,
na encarnação, por
meio de Maria (Natal),
e a vinda escatológica, ao final dos tempos
(Parusia). Essas duas vindas são consideradas como
uma só, desdobrada em
duas etapas. Essa dupla
dimensão caracteriza todo o Advento.
São Bernardo acrescentou uma vinda: a vinda
do Senhor às almas
pela graça.
Essa é a vinda principal,
sem a qual
as outras duas nos resultariam inúteis ou perigosas. Sem
a graça na alma,
torna-se inútil a primeira
vinda de Cristo
para nos redimir, pois a graça é o fruto
da redenção. E sem
a graça na alma,
será terrível a segunda
vinda de Cristo
para nos julgar, porque seria,
então, como
uma vinda para
nos condenar.
Quando se fala
da vinda, fala-se também
da espera. Esperar é
situar-se em estado
de receptividade. Mas a nossa espera deve ser acompanhada com esperança. Esperar com esperança é
estar convencido
de que, pela
fidelidade de Deus,
vai nos chegar
algo que
supera nossas forças e que deve vir: o Reino de Deus em sua plenitude. O estado
de receptividade exige outra atitude: vigilância.
“Vigiar” equivale a velar
solicitamente sobre algo
ou sobre
alguém durante
um tempo,
até alcançar
o final desejado. A vigilância
diante da chegada
de Deus equivale a estar
desperto, em disposição
de serviço, com
uma atitude atenta
diante do futuro,
sem evasão
do presente, apesar
da indiferença encontrada neste mundo.
A vigilância consiste em discernir os sinais dos tempos
para reconhecer a presença de Deus e do
seu reino
nos acontecimentos.
Preciso descobrir
o que Deus
quer de mim
e o que Ele
quer me
falar através
de tudo isso.
Mas, se converter
um processo religioso da espera em algo comercial que logo pode converter-se em
qualquer coisa,
o cristão não
espera mais em nada e a esperança cristã será uma palavra
vazia e que,
precisamente por
isso, segue a lei
do vazio de deixar-se preencher
por outras esperanças
caducas.
É preciso
esperar a chegada
do Senhor com
humildade. Ser
humilde significa aceitar
a parte terrena
que todos
temos; significa descer, buscar
e encontrar tudo
o que somos, aceitando-nos tal como somos.
Quando o coração
se faz humilde, ele
é capaz de amar
em abundância.
Ser humilde é
deixar a luz
de Deus entrar
no nosso coração
para fazer desaparecer
os maus sentimentos
que produzem nossas misérias.
Nunca serei compassivo,
se eu não
admitir minha
dureza interior.
Nunca chegarei a ser
criativo, se eu
não for capaz
de reconhecer toda
a minha mesquinhez que
se esconde no meu coração.
“Humildade é a honesta
confissão do ser
pecador. É melhor
um pecador
humilde que
um beato
orgulhoso” (Santo
Agostinho).
Portanto, aproveitemos o Advento para dar
um bom
passo ao nosso
interior. Façamo-nos humildes e teremos a grande
felicidade de viver
plenamente o Natal. FELIZ ADVENTO!!!
SHALOM !!!
P. Vitus Gustama,svd
II
VIGILÂNCIA CRISTÃ É
ESTAR PREPARADO PARA ACOLHER O SENHOR QUE VEM NOS SALVAR
I DOMINGO DO ADVENTO DO ANO “B”
30 de Novembro de 2014
Evangelho:
Mc 13,33-37
Naquele
tempo, disse Jesus aos seus discípulos: 33 Cuidado! Ficai atentos, porque
não sabeis quando chegará o momento. 34 É como um homem que, ao partir
para o estrangeiro, deixou sua casa sob a responsabilidade de seus empregados,
distribuindo a cada um sua tarefa. E mandou o porteiro ficar vigiando. 35 Vigiai, portanto, porque não
sabeis quando o dono da casa vem: à tarde, à meia-noite, de madrugada ou ao
amanhecer. 36 Para
que não suceda que, vindo de repente, ele vos encontre dormindo.
37O
que vos digo, digo a todos: Vigiai!”
-------------------
Mc 13,1-37, onde se encontra o
texto evangélico deste domingo primeiro domingo do Advento do Ano litúrgico
“B”, é conhecido como “Apocalipse de Marcos” ou “discurso escatológico”. É um
discurso mais amplo de Jesus de todo o evangelho de Mc. Mc abre a seção com a
admiração dos discípulos pelo esplendor do Templo(v.1), que recebe a resposta de Jesus sobre o
desaparecimento iminente de todo esse esplendor(v.2). Por isso, surge a
pergunta dos discípulos sobre o tempo em que
tudo isso acontecerá e os sinais que anunciarão isso(vv. 3-4).
Percebemos na seqüência da narrativa que a pergunta não se faz a respeito da
destruição do templo, e sim a respeito dos últimos dias, pois o discurso vai
falar dos acontecimentos dos últimos dias e dos sinais que precederão, e não da
destruição de Jerusalém e do templo.
Neste capítulo 13, Mc une diversas
matérias: algumas são propriamente apocalípticas que descrevem os
acontecimentos dos últimos dias e a atitude requerida perante os
mesmos(vv.7-8.14-20.24-27; e outro bloco: vv.5-6.21-23); outras têm o tom de
consolação e conforto para os cristãos nos momentos de perseguição(vv.9-13). E
no fim do discurso encontram-se outras matérias diversas: a parábola da figueira(vv.28-29);
o momento da parusia(vv.30-32) e termina com a exortação para a
vigilância(vv.33-37).
Apesar das matérias diversas, Mc
consegue colocar todas elas dentro duma inclusão literária constituída pelos
vv.5 e 37 que enfatiza a importância da vigilância. Na exortação inicial
fala-se do perigo dos falsos messias que surgem sempre quando a sociedade passa
por uma crise profunda o que leva a tomar uma atitude de vigilância(vv.5-6). E
na última exortação fala-se da falsa segurança. Daí percebemos a intenção de Mc
em alertar os cristãos para que estejam vigilantes constantemente, pois ninguém
sabe quando chegará o “momento”(v.33). O que o mais importante, então, não é o
momento em que isso acontecerá, e sim o que deve-se fazer para que ninguém se pegue de surpresa.
O ensinamento que nos oferece esta
unidade narrativa tem como destinatários a um grupo restringido de
discípulos(cf. Mc 13,3). Esta unidade se situa imediatamente antes dos
acontecimentos da paixão e da morte de Jesus que pode nos induzir a pensar que
nos encontramos diante de um discurso de despedida. Em seus últimos dias em
Jerusalém, Jesus revelaria aos mais íntimos os sofrimentos e perigos que lhes
aguardavam, exortando-lhes a fidelidade e a perseverança na missão que lhes
havia confiada.. Sem dúvida, neste discurso faltam as marcas características
dos discursos de despedida(cf. Jo 13-17). Por isso, este discurso deve-se
considerar muito mais como um discurso escatológico, do que um simples discurso
de despedida, que com uma linguagem profético- apocalíptica, descreve a missão
da comunidade cristã no período intermédio , isto é, no presente.
A missão confiada à comunidade
cristã não é fácil. Ela tem que seguir fielmente os ensinamentos de Jesus
Cristo a ponto de ser crucificada como ele. Da comunidade cristã exigem-se a
fidelidade, a coragem e a vigilância no presente, sublinhando o futuro que lhe
aguarda. A vitória que lhe aguarda faz a comunidade lutar sem medo apesar de
dificuldades que ela encontra no caminho.
Mensagem
do texto de Mc 13,33-37
Não é difícil descobrir o tema
central do Evangelho deste Domingo: basta observar qual é a palavra que aparece
mais vezes. É o verbo “vigiar” que em cinco versículos é repetido com uma
insistência quase excessiva.
Por que temos que vigiar?
Jesus nos dá este motivo: “Prestai
atenção, vigiai, pois não sabeis quando será o tempo/momento”(v.33). “Tempo” ou
“momento” é uma tradução da palavra grega “kairós”. “Kairós” indica um tempo determinado
e tem aqui uma conotação escatológica de tempo determinado por Deus para a
vinda gloriosa do Cristo. Esse “tempo determinado” é desconhecido dos homens.
Daí a necessidade de estar sempre vigilante à espera desse tempo determinado
por Deus.
A exortação de Jesus à vigilância
visa criar no nosso coração a atitude correta de quem deseja acolher o Senhor
que vem ao nosso encontro. A exortação não fornece o temor e a angústia, pois,
de fato, nós esperamos o que já temos garantido pela fé que é o fundamento de
nossa esperança. E por sua vez, a esperança mantém e reaviva o nosso amor por
Cristo que vem. Por isso, a espera cristã deve ser produtiva, alegre e serena.
Mas o que é vigiar?
Vigiar, no sentido próprio,
significa renunciar ao sono da noite; pode-se fazê-lo para prolongar o
trabalho(Sb 6,15) ou para evitar ser apanhado de surpresa por um inimigo(Sl
127,1s). Daí o sentido metafórico: vigiar é lutar contra o torpor e a
negligência a fim de se chegar à meta visada(Pv 8,34). Para o crente/cristão a
meta é estar pronto para receber o Senhor, quando chegar o seu Dia; é por isso
que ele vigia e está vigilante, a fim de viver na noite sem ser da noite.
Nos evangelhos sinôticos, a
exortação à vigilância é a principal recomendação de Jesus a seus discípulos
como conclusão do seu discurso escatológico . A vigilância caracteriza,
portanto, a atitude do cristão/discípulo que espera e aguarda a volta do
Senhor: ela consiste antes de tudo em manter-se em estado de alerta, e com isso
mesmo exige o desprendimento dos prazeres e dos bens da terra(Lc 21,34ss). A
Igreja é a assembléia que sempre deve estar em estado de vigilância, lendo a
vinda do Senhor nos acontecimentos, para permitir-lhe um encontro feliz com o
Senhor glorioso.
Concretamente podemos dizer que
vigiar significa pôr em prática as palavra de Jesus, especialmente o mandamento
do amor. Significa enfrentar a tentação do egoísmo, que nos leva a
convencer-nos da inutilidade de fazer o bem. Significa acreditar que vale a
pena lutar para construir o Reino de Deus, a exemplo de Jesus, num mundo onde a
injustiça e a maldade parecem falar mais alto. Significa estar sempre disposto
a perdoar e a se reconciliar, revertendo a espiral da violência que assume proporções
sempre maiores. Significa ser capaz de detectar tudo quanto possa desviar nossa
atenção do convite de Deus para o encontro definitivo com Ele. Significa estar
vigilante no que se deve falar e no que não se deve: ser vigilante nos
comentários, nos julgamentos etc....Vigiar é aprender a falar o
necessário. É aprender a ficar em
silêncio para avaliar as palavras soltas sem reflexão para não repeti-las
novamente.
A vigilância é a atitude própria do
amor que vela. O amor sempre mantém o coração alerta. A chegada de Cristo
exclui todo temor, pois não há temor no amor. A vigilância nos ensina a ler a
vinda do Senhor nos acontecimentos e nas pessoas.
Para manter este estado de
vigilância é necessário lutar porque temos a tendência de vivermos de olhos
cravados nas coisas da terra. O dono da casa, na parábola, é Jesus Cristo. Isto
quer dizer que Ele é o sentido da nossa vida. É a razão de ser da Igreja.
Trabalhemos para que na chegada do Senhor a justiça, a misericórdia, o perdão e
obras de caridade estejam bem cultivados entre nós.
Mas a vigilância cristã é sempre
perseverante e se alimenta da esperança. Por isso, a pessoa vigilante não se
abate, ainda que a realidade seja desesperadora porque ele sabe em quem
acredita: em Deus que transforma o impossível no possível. Um cristão vigilante
sabe olhar para além da História do horizonte material e contemplá-la na
perspectiva de Deus, segundo o ensinamento de Jesus. A vigilância permite o
cristão descobrir nela uma lógica inacessível para quem não tem fé. Por isso,
um cristão verdadeiro nunca será esmagado pelo peso da história e pela situação
desesperadora.
Portanto, celebrar o Advento não
significa celebrar só as coisas do passado, pois este Advento está sempre em
andamento. É o Filho de Deus que continuamente visita e freqüenta o coração
daqueles que sabem crer, amar e esperar. Cristo está em contínuo advento,
sempre e incansavelmente a caminho de nossa casa. E o lugar que Ele mais
ambiciona é um coração convertido, que tenha a coragem de se “reformar” e de se
abrir ao amor, à fraternidade, à justiça e ao perdão. Por isso, não tenhamos
medo de oferecer-lhe nosso ódio, amargura, desapontamento, mágoa, rancor,
tristeza, desespero etc. porque o Senhor se revela como AMOR. Só criando espaço
para Cristo num coração convertido é que conseguiremos chegar à meta e Cristo
virá morar conosco.
Por isso, o Advento é o tempo de
purificação, de revermos nossa vida: nossos gestos, nosso lar pois é Deus que
se aproxima. Mais do que de flores, de lâmpadas coloridas ou de pinheiros
verdes, vamos enfeitar o nosso coração
daquilo que não se encontra nas lojas: a paz e a alegria no lar e o amor no coração: o amor é uma “carta”
aberta, um presente sem embalagem, pois o amor é a abertura para com os outros.
Vamos fazer presépio vivo no nosso coração, um presépio construído com toda a
sensibilidade, com a arte de amar, de perdoar, um presépio de carinho. E este
presépio vivo dentro de nosso coração se expressa através de amor e de alegria
nos cartões, nas cartas e nos telefonemas. Este presépio vivo dentro de nós
deve ser eterno, não é preciso acabá-lo dentro de alguns dias durante o Natal.
Temos uma vida para aperfeiçoá-la. Vamos fazer de nossa vida um eterno Natal de
amor e de alegria.
Portanto, a palavra “vigiar” que
aparece várias vezes no Evangelho deste primeiro Domingo do Advento é para a
gente vigiar mesmo. Porque quando chega o Natal, as propagandas comerciais, a
arrumação da casa e a preocupação dos cartões e dos presentes podem desviar
nossa atenção do dono da festa: Jesus Cristo.
Que cada um de nós seja capaz de
dizer e de viver esta frase: “Quero neste Natal ser rico por dentro. Não quero
ter apenas embalagem, quero ter um coração como o de Cristo, cheio de amor e de
justiça e de perdão.”
P. Vitus Gustama,svd