quinta-feira, 21 de maio de 2015

Domingo,24/05/2015
PENTECOSTES

PAPEL DO ESPÍRITO SANTO E SEUS FRUTOS NA VIDA DO CRISTÃO

 

Textos de Leitura: At 2,1-11; 1Cor 12,3-7. 12-13; Jo 20,19-23
 

Hoje celebramos o Pentecostes: a festa do Espírito Santo. Ele fundamenta a missão de Jesus e fundamenta a missão da Igreja. Só no livro de Atos dos Apóstolos, de onde tiramos o relato de Pentecostes, o Espírito Santo é mencionado 45 vezes. Em conseqüência disto, com razão, a dupla obra de Lucas (o Evangelho de Lucas e Atos dos Apóstolos) é designada como “o Evangelho do Espírito Santo”. O Espírito Santo é a plenitude de tudo quanto Deus tem que nos dar. Na liturgia há uma exuberância de imagens e comparações para exprimir o que o Espírito Santo é e faz. Ele santifica, fortifica e consola. Ele aquece quando estamos frios; ele nos ajuda e nos cura. Ele torna flexível o que é rígido, purifica, ilumina na escuridão. Ele é como uma língua, como descreve os Atos e como uma pomba na descrição dos Evangelhos. Ele é sopro, o dedo de Deus com que foi criado o universo. Renova continuamente a face da terra.


Como nós sabemos que o Espírito Santo é a terceira Pessoa da Santíssima Trindade. É simples esta frase, mas rico é o seu conteúdo. Ela significa que Deus é uma “família”. Deus não é um Deus solitário. Deus é uma comunidade; uma convivência. Há em Deus uma comunicação perfeita. Há em Deus uma convivência que é completa e desconhece qualquer sombra.  É conhecimento do outro numa unidade indivisa. O Espírito Santo é o vínculo de união perfeita entre Pai e Filho. O Espírito Santo é aquele que supera a relação Eu-Tu e introduz o Nós. Por isso, ele é por excelência a união entre Pessoas divinas.


No evangelho de São João (cf. Jo 14,26; 15,26-27; 16,13-15; 14,16-18) o Espírito Santo é chamado de Paráclito, termo de origem grega do mundo jurídico que é traduzido por advogado, auxiliar, defensor. Em que sentido? Em situação de sofrimento e dor, o Espírito santo desempenha seu papel como consolador. Nas decisões importantes em que ele é invocado o Espírito Santo se faz conselheiro. Ele nos interpela, acusa e questiona na nossa mediocridade, apatia e no nosso desânimo (cf. Jo 16,8). Como o verdadeiro advogado o Espírito Santo nos conduz para a plena verdade (Jo 16,13-15) que é o próprio Jesus Cristo, o Caminho, a Verdade e a Vida (Jo 14,6). O Espírito Santo nos conduz a Jesus pela dupla via: pela via do conhecimento e do amor e nos leva ao seguimento de Jesus até o fim, ao anúncio do Reino, à opção pelos pobres. Aqui consiste a trilogia fundamental: conhecer intimamente, amar profundamente e seguir a Jesus fielmente. Quem nos possibilita tudo isso é o Espírito Santo.


O mesmo evangelho de João nos afirma que pelo batismo recebemos o Espírito Santo que nos habita o coração (cf. Jo 3,5-8.34). E o Espírito Santo prometido por Jesus tem uma função de ensinar, recordar, comunicar e conduzir à verdade de Jesus diante do risco de a Igreja perder o rumo em relação à memória e a compreensão de Jesus (cf. Jo 15,26; 16,14s).


Na história, o Espírito Santo se mostra como uma força vulcânica que ninguém pode segurar, como um vendaval (vento tempestuoso) que toma as pessoas e as leva a fazer obras grandiosas. Cabe ainda ressaltar mais algumas características do Espírito Santo.


Ele é a força do novo e da renovação de todas as coisas: cria ordem na criação, faz surgir o novo Adão no seio de Maria, impulsiona Jesus para a evangelização, ressuscita o crucificado dos mortos, antecipa a humanidade nova na Igreja e nos traz, no final, o novo céu e a nova terra. Que seria da sociedade e das Igrejas se não surgissem os inovadores, as pessoas criativas, que têm idéias novas, que descobrem novos caminhos para a educação, a política, a religião etc.? O Espírito Santo certamente está ligado ao novo e ao alternativo.


Ele é o atualizador da memória de Jesus. Ele atualiza a mensagem de Jesus. Ele nunca deixa que as palavras de Jesus permaneçam mortas, mas que sempre sejam relidas, ganhem novas significações e implementem novas práticas. Ele continua a obra de Jesus nas comunidades.


Ele é o princípio libertador das opressões de nossa situação de pecado, chamada pela Bíblia de carne. Carne expressa o projeto da pessoa voltada sobre si mesma, esquecida dos outros e de Deus. Ele sempre é gerador de liberdade (1Cor 3,17), de entrega aos demais e de amor.


Ele produz unidade, e ao mesmo tempo, promove diferentes maneiras de servir, como descreve a Carta de São Paulo aos coríntios (1Cor 12,3-7.12-13). Ele é a força criadora de diferenças e de comunhão entre as diferenças. É ele que suscita entre as pessoas os mais diversos dons e nas comunidades os mais diferentes serviços e ministérios, como se ensina nas cartas aos Romanos (Rm 12) e aos Coríntios (12). Mas esta diversidade não decai em desigualdades e discriminações porque bebemos da mesma fonte que é o Espírito Santo (1Cor 12,13). Os dons ou os carismas não são dados para a autopromoção, mas para o bem da comunidade (1Cor 12,7). A base da palavra “carisma” é “charis” (grego) que significa “graça”. Por isso, carisma é resultado de uma ação da graça (charis). O carisma articula o dom pessoal com o bem da comunidade.  o carisma existe em vista da construção social ou do bem comum.  Ou na linguagem de São Paul podemos dizer por carisma, uma manifestação gratuita do Espírito Santo que atua para o bem comum do povo de Deus. o carisma não é para o gozo individual, mas a serviço da comunidade no sentido da comunidade eclesial, o Corpo de Cristo.


No Pentecostes o sinal importante do Espírito Santo não foi uma confusão de línguas que ninguém entende, mas foi a capacidade de falar de tal modo que todo mundo se sentiu à vontade com a mensagem. A linguagem que todos entendem é o amor. O Espírito Santo interfere para melhorar e não para atrapalhar a comunicação da Igreja de Jesus Cristo. A comunidade fundada em Pentecostes (no Espírito Santo) é um lugar de diálogo, de encontro, de comunicação, de unidade (não necessariamente uniformidade), de acolhimento. O erro não está em sermos diferentes. O erro está em sermos divididos. A comunidade nascida em Pentecostes não é o lugar da lei que mata, mas é o lugar do Espírito Santo, isto é, o lugar da abertura e da vida, do reconhecimento e do despertar, o lugar de uma libertação fundada no amor. O amor é o caminho para Deus, o único carisma realmente imprescindível na vida cristã, o carisma que jamais cessará.
 

No começo da Bíblia, na construção da torre de Babel todo mundo que falava a mesma língua começou a se desentender, um não compreendia mais o outro porque estavam fazendo uma obra do orgulho, um monumento para celebrar a própria importância dos construtores e não para servir Deus (Gên 11,1-9).
  

Quando, na Igreja, cada um fica mais preocupado com o próprio prestígio ou com o prestígio de seu grupo do que com o serviço para o bem de todos (da comunidade), acontece de novo o que está representado na torre de Babel: a comunidade não se entende, fica desunida. Comunidade desunida não constrói como Jesus deseja. A obra fica paralisada no meio. Se cada cristão esquecer sua missão de serviço a Deus e começar a cuidar do seu próprio prestígio e poder, ele também terá dificuldades em se fazer entender.


O Espírito Santo foi derramado sobre todos no batismo. Ele habita os corações das pessoas (1Cor 3,16), dando-lhes entusiasmo, coragem e determinação. Ele consola os aflitos e mantém viva a esperança. Ele nos consola, exorta e ensina como as mães fazem junto a seus filhinhos (Jo 14,26;16,13) Um grande teólogo cristão, Mário (+ 334) dizia: “ O Espírito  Santo é a nossa Mãe porque o Paráclito,  o Consolador está pronto a nos consolar como uma mãe consola o seu filho e porque os fiéis são renascidos dele e são assim os filhos desta Mãe misteriosa que é o Espírito Santo”. Ele não nos deixa órfãos (Jo 14,18). Ele nos educa na oração e na forma de pedir as coisas verdadeiras: “O Espírito vem em auxílio à nossa fraqueza; porque não sabemos o que devemos pedir, nem orar como convém, mas o Espírito mesmo intercede por nós com gemidos inefáveis” (Rm 8,26).


Na liturgia a presença do Espírito Santo é também destacada.  Começamos a celebração em nome da Trindade. As orações são dirigidas ao Pai pelo Filho no Espírito Santo. A presença do Espírito Santo na liturgia é destacada no momento de duas epicleses (as duas invocações do Espírito Santo). A primeira epiclese acontece na consagração em que o pão e o vinho se tornam sacramento do Corpo e do Sangue de Jesus pela invocação do Espírito Santo. Ao Espírito Santo se atribui a consagração: “Na verdade, ó Pai, Vós sois santo e fonte de toda santidade, santificai, pois, estas oferendas, derramando sobre elas o Vosso Espírito, a fim de que se tornem para nós o Corpo e o Sangue de Jesus Cristo, Vosso Filho e Senhor nosso” (cf. Oração eucarística II). A segunda epiclese (a 2ª invocação do Espírito Santo) acontece depois da consagração em que se suplica ao Pai para que todos os que vão participar do Corpo e do Sangue de Cristo sejam reunidos num só corpo pelo Espírito Santo para formar uma verdadeira comunhão de irmãos. A Eucaristia deve construir, como resultado, uma verdadeira comunidade pela força do Espírito Santo. Comungar não é mais uma coisa privada e sim um momento para criar e fortalecer a comunidade. As duas epicleses têm a mesma importância.


Outros frutos do Espírito Santo são o amor, a bondade, moderação e autocontrole, cortesia, mansidão e longanimidade, jovialidade e paz (veja Gl 5,22-24).


Segundo Gálatas, o amor que é o fruto do ES se expressa através de cordialidade, simpatia, coração bom. Trata-se de uma atitude típica da interioridade; é a disposição interior para o pensar bem, para o falar bem, para o agir bem. O amor traduzido com cordialidade, simpatia(simpatia vem do grego sumpáscho que significa igualar-se ao outro, ter uma atitude de profunda sintonia com o outro), coração aberto é a capacidade imediata de entender os sofrimentos e as alegrias de quem está perto de nós; é um coração espaçoso, raiz de toda a moral do NT. O amor é a virtude pela qual resplandecem até mesmo as coisas mais pequenas, e os gestos mais simples se tornam belos e construtivos. Tudo que se faz com amor, por pequeno que seja, se torna uma obra prima. E nada vale aquilo que se faz sem amor, por maior que ele seja.


A bondade é fruto do ES. A bondade é um reflexo da atitude divina. Ela é a prerrogativa daquele que se compraz em fazer por primeiro o bem, em suscitar sempre e somente o bem ao seu redor. Ela é uma qualidade criativa(tudo que Deus criou era bom. cf. Gn 1). Nossa bondade é nada mais que uma participação, no ES, da característica divina, e por isso, é bela, criativa, fascinante, capaz de suscitar uma sociedade nova. Nenhum coração resiste diante da bondade. Se a bondade é fruto do ES, então, ela é um dom a ser invocado, a ser implorado, dispondo-nos a acolhê-lo com humildade e reconhecimento.
 

Outro fruto do ES é a moderação. A palavra que se usa em grego é epieíkeia (ocorre 7 vezes no NT) que significa respeito, afabilidade, acessibilidade, moderação, flexibilidade e equilíbrio ao aplicar as leis, as regras; é capacidade de saber prever também as oportunas exceções às regras. Trata-se de uma atitude fundamental na vida social. O contrário da moderação é a arrogância, a petulância, a rudez, a presunção, a falta de educação etc.


O domínio de si ou autocontrole, que é outro fruto do ES, está muito ligado à moderação. É uma atitude que exige de si o respeito pelo outro, mantendo sob controle os próprios sentimentos ou instintos de poder e de prevaricação, de ser oportunista diante da fragilidade do outro. O autocontrole evita todo senso de superioridade e toda violência física,  verbal e moral nos relacionamentos; evita a exploração da dignidade alheia; evita a busca da própria vantagem, do próprio prazer em prejuízo da dignidade ou do interesse de alguém. É uma virtude social fundamental.
 

A cortesia é outro fruto do ES. Ela é a atitude de Deus em relação ao homem, o modo com o qual o Senhor se comporta conosco, segundo o que Jesus diz: “Ele é benévolo (chrestós) para os ingratos e para os maus” (cf. Lc 6,35). A cortesia é a arte de acolher, de ir ao encontro do outro fazendo-o sentir que é bem-vindo, esperado, amado. Quando uma pessoa se sente acolhida, estimada e compreendida, ela se solta, fala, dá corda ao discurso.


Outro fruto do ES é a mansidão. Ela é uma atitude que facilmente pode ser mal interpretada, pois é confundida com a fraqueza ou com a ingenuidade. Mas, na verdade, ela é a atitude típica de Jesus que se autodefine manso (cf. Mt 11,29). E ela é uma das bem-aventuranças por ele proclamada (cf. Mt 5,5). Mansidão é a atitude que acalma a ira ou cólera. A mansidão é a atitude de quem elimina ou modera a própria cólera e a dos outros; é responder à ira com a ponderação.


A longanimidade é outro fruto do ES. É uma virtude que está ligada estreitamente à cortesia e à mansidão. Ela permite sustentar no tempo a esperança (Cf. Lc 13,6-9; 2Cor 2,1-4). Ela é a capacidade de saber investir, sem pretender a obtenção de resultados imediatos ( o contrário da precipitação). Ela é a atitude que permite superar frustrações, que permite superar a irritação e o desencorajamento diante da aparente esterilidade da ação apostólica, educativa, formativa. Ela nos permite semear, eventualmente com sofrimento, olhando para a colheita que nos será dada pelas mãos de Deus. Ela nos convida a ter coragem e a resistir, na certeza de que da resistência virá a alegria.
   

Outro fruto do ES é a alegria/jovialidade (cf. Fl 4,4-7). O termo grego “chará” que se traduz por “alegria”, ocorre 59 vezes no NT, sem contar os sinônimos e os verbos a ele ligados. É muito mais fácil experimentar a alegria do que defini-la. Ela é a atitude que torna tudo mais fácil. “Deus ama a quem doa com alegria” (2Cor 9,7), pois quem doa com alegria, doa bem. Ela é a capacidade que torna outros felizes e contentes. Ela é um sinal claríssimo da presença do ES. Se quisermos entender onde o ES está agindo, precisamos verificar a presença ou a ausência da alegria. Onde há a alegria, está aí o ES. O objetivo da obra de Jesus é o tornar-nos plenos de alegria: “Eu vos disse isso para que a minha alegria esteja em vós e a vossa alegria seja plena” (cf. Jo 16,22-24). Por isso, ela é a característica típica do Reino de Deus.
   

O oposto da alegria é a tristeza, aquele sentimento pelo qual tudo parece mais pesado. E uma variante da tristeza é a depressão ou mau humor, a melancolia, o descontentamento. Como resistir à atitude da tristeza? Como superar a depressão? É invocar o ES, pois a alegria é o dom do ES. É preciso invocar o ES, na certeza de que a alegria existe, de que ela está no fundo de nós mesmos, porque ela é a presença de Jesus ressuscitado ainda que esteja escondida. A alegria vem e virá, e tal certeza, cultivada no coração, ajuda a superar depressões, maus humores, escuridão etc..
   

Outro fruto conjuntural e central do ES é a paz (shalom), que representa também uma espécie de síntese de todo bem na Bíblia. Biblicamente a paz é entendida como todo e qualquer bem, humano e divino. Por isso, São Paulo até diz: “E a paz de Deus, que ultrapassa toda a compreensão, guardará vossos corações e vossos pensamentos em Jesus Cristo (Fl 4,7). A paz podemos definir como a atitude que nos defende da ânsia, que reina sobre a ânsia, que a domina. Ela é, obviamente, dom de Deus, do Espírito; é a riqueza que o Espírito derrama sobre os que a acolhem. A paz é a sensação de sentir-se em casa, de ter familiaridade com o ambiente em que vivemos. E sentir-se em casa com Deus, em Deus; o repouso em Deus é a paz que bloqueia a inquietude do coração. Como dizia Sto. Agostinho: “Nosso coração está inquieto enquanto não repousa em ti”. A paz é sentir-se em casa com os outros, quando os relacionamentos são construtivos. A paz leva a pessoa a superar os medos e as desconfianças recíprocas.
   

Os Atos dos Apóstolos relatam um curioso episódio: Chegando a Éfeso, Paulo encontrou alguns discípulos e lhes perguntou: “‘Recebestes o Espírito Santo, quando abraçastes a fé?’ responderam-lhe: ‘Não, nem sequer ouvimos dizer que há um Espírito Santo’”(At 19,1).


Se dirigíssemos hoje a mesma pergunta a muitos cristãos, receberíamos talvez uma resposta desse mesmo tipo: sabem, sim, que existe um Espírito Santo, mas é tudo o que sabem a respeito d’Ele; de resto, ignoram quem é, na realidade, o Espírito Santo e o que representa para a vida deles.


Portanto, mais do que nunca, reunamo-nos hoje em torno da Igreja para invocar, em uníssono, sobre nós, sobre nossa família e sobre o mundo inteiro, o Espírito Santo que é Espírito de reconciliação, de unidade, de renovação, de harmonia, de amor, de alegria, de mansidão, de cortesia, de longanimidade, de moderação, de autocontrole e de paz. E que estejamos abertos permanente diante do Espírito Santo que quer nos renovar e transformar em criaturas novas e renovadas de Deus.

P. Vitus Gustama,svd
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