domingo, 26 de março de 2017




30/03/2017
 

SER CRISTÃO É  SER TESTEMUNHA  DE CRISTO COM OBRAS BOAS

Quinta-Feira da IV Semana da Quaresma

I Leitura: Ex 32,7-14

Naqueles dias, 7 o Senhor falou a Moisés: “Vai, desce, pois corrompeu-se o teu povo, que tiraste da terra do Egito. 8 Bem depressa desviaram-se do caminho que lhes prescrevi. Fizeram para si um bezerro de metal fundido, inclinaram-se em adoração diante dele e ofereceram-lhe sacrifícios, dizendo: ‘Estes são os teus deuses, Israel, que te fizeram sair do Egito!’” 9 E o Senhor disse ainda a Moisés: “Vejo que este é um povo de cabeça dura. 10 Deixa que minha cólera se inflame contra eles e que eu os extermine. Mas de ti farei uma grande nação”. 11 Moisés, porém, suplicava ao Senhor seu Deus, dizendo: “Por que, ó Senhor, se inflama a tua cólera contra teu povo, que fizeste sair do Egito com grande poder e mão forte? 12 Não permitais, te peço, que os egípcios digam: ‘Foi com má intenção que ele os tirou, para fazê-los perecer nas montanhas e exterminá-los da face da terra’. Aplaque-se a tua ira e perdoa a iniquidade do teu povo. 13 Lembra-te de teus servos Abraão, Isaac e Israel, com os quais te comprometeste por juramento, dizendo: ‘Tornarei os vossos descendentes tão numerosos quanto as estrelas do céu; e toda esta terra de que vos falei, eu a darei aos vossos descendentes como herança para sempre”’. 14 E o Senhor desistiu do mal que havia ameaçado fazer a seu povo.

Evangelho: Jo 5, 31-47

Naquele tempo, disse Jesus aos judeus: 31“Se eu der testemunho de mim mesmo, meu testemunho não vale. 32Masum outro quetestemunho de mim, e eu sei que o testemunho que ele dá de mim é verdadeiro. 33Vós mandastes mensageiros a João, e ele deu testemunho da verdade. 34Eu, porém, não dependo do testemunho de um ser humano. Mas falo assim para a vossa salvação. 35João era uma lâmpada que estava acesa e a brilhar, e vós com prazer vos alegrastes por um tempo com a sua luz. 36Mas eu tenho um testemunho maior que o testemunho de João; as obras que o Pai me concedeu realizar. As obras que eu faço dão testemunho de mim, mostrando que o Pai me enviou. 37E também o Pai que me enviou dá testemunho a meu favor. Vós nunca ouvistes sua voz, nem vistes sua face, 38e sua palavra não encontrou morada em vós, pois não acreditais naquele que ele enviou. 39Vós examinais as Escrituras, pensando que nelas possuís a vida eterna. No entanto, as Escrituras dão testemunho de mim, 40mas não quereis vir a mim para ter a vida eterna! 41Eu não recebo a glória que vem dos homens. 42Mas eu sei que não tendes em vós o amor de Deus. 43Eu vim em nome do meu Pai, e vós não me recebeis. Mas, se um outro viesse em seu próprio nome, a este vós o receberíeis. 44Como podereis acreditar, vós que recebeis glória uns dos outros e não buscais a glória que vem do único Deus? 45Não penseis que eu vos acusarei diante do Pai. Há alguém que vos acusa: Moisés, no qual colocais a vossa esperança. 46Se acreditásseis em Moisés, também acreditaríeis em mim, pois foi a respeito de mim que ele escreveu. 47Mas se não acreditais nos seus escritos, como acreditareis então nas minhas palavras?”
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1. Idolatria De Ontem e De Hoje

Vai, desce, pois corrompeu-se o teu povo, que tiraste da terra do Egito. Bem depressa desviaram-se do caminho que lhes prescrevi. Fizeram para si um bezerro de metal fundido, inclinaram-se em adoração diante dele e ofereceram-lhe sacrifícios, dizendo: ‘Estes são os teus deuses, Israel, que te fizeram sair do Egito!’”, falou o Senhor para Moisés.

A Primeira Leitura nos relata o pecado do povo eleito. Não é um pecado de apostasia, pois o povo não renega seu Deus (Ex 32,4-5), nem um pecado de apego às riquezas materiais ou de culto ao dinheiro, mas fabricaram um bezerro de metal para ser adorado. Trata-se de idolatria. É o pecado contra o segundo mandamento do decálogo: “Não farás para ti escultura, nem figura alguma do que está em cima, nos céus, ou embaixo, sobre a terra, ou nas águas, debaixo da terra. Não te prostrarás diante delas e não lhes prestarás culto. Eu sou o Senhor, teu Deus, um Deus zeloso que vingo a iniqüidade dos pais nos filhos, nos netos e nos bisnetos daqueles que me odeiam, mas uso de misericórdia até a milésima geração com aqueles que me amam e guardam os meus mandamentos” (Ex 20,4-6).

Quando estava com eles (os hebreus), era Moisés quem lhes manifestava os planos e os desejos de Deus e lhes transmitia a Palavra de Deus. Mas agora, na ausência de Moisés eles se queixam. Além disso, eles se esqueceram que Moisés era o instrumento e intérprete da vontade divina. Por isso, eles buscam outras seguranças e não são capazes de permanecer em Deus que os tirou do Egito.

Devemos reconhecer que este é também nosso freqüente pecado. Não renegamos Deus, mas queremos um Deus ao nosso alcance, à nossa medida. Em vez de servir Deus, utilizamos Deus para Ele nos servir. Queremos Deus “domesticado”.

Diante do povo idólatra  Deus decide:  “Vejo que este é um povo de cabeça dura. Deixa que minha cólera se inflame contra eles e que eu os extermine”.

Esta reação de Deus mostra que Ele leva a sério as coisas. Não se pode andar com ambigüidade ou em meio termos. Deus é um Deus zeloso (Ex 20,5). Por outro lado, esta reação é completamente normal e necessária: a aliança é coisa de dois: de Deus com o povo eleito. Deus toma a sério a aliança. A aliança é comunhão de pessoas, não pode ser restabelecida mecanicamente e sim a relação real entre o homem e Deus. O povo eleito cometeu a idolatria.

Mas Moisés faz suplica a Deus para que perdoe o povo: Por que, ó Senhor, se inflama a tua cólera contra teu povo, que fizeste sair do Egito com grande poder e mão forte? Não permitais, te peço, que os egípcios digam: ‘Foi com má intenção que ele os tirou, para fazê-los perecer nas montanhas e exterminá-los da face da terra’. Aplaque-se a tua ira e perdoa a iniquidade do teu povo”. Por causa do pedido de Moisés Deus cancela o castigo sobre o povo: “O Senhor desistiu do mal que havia ameaçado fazer a seu povo”.

Em sentido próprio e clássico, idolatria é a adoração ou o culto que se tributa a entidades, objetos, imagens ou elementos naturais que se consideram dotados de poder divino, ou também a divindades falsas. A palavra “idolatria” provém do grego “eidolon”, imagem. É evidente que neste sentido se trata de um termo contextual que tem significado somente dentro de uma religião conhecida.

A idolatria é uma verdadeira aberração na ordem religiosa e moral já que nela se inverte por completo a ordem dos valores: o Absoluto, Deus, se relativiza, e o relativo se absolutiza. O que não é Deus ou o que é inferior aos homens se considera como Deus ou algo divino.

Quem pratica a idolatria erra no conhecimento de Deus (cf. Sb 14,22) e quem erra no mais fundamental acerca de Deus, pode chegar aos erros mais inimagináveis ético-religiosos, começando pela negação da existência do próprio Deus. Os autores sagrados estão familiarizados com a verdade de fé de que Deus é o Criador e Senhor absoluto dos homens e do universo. Com o projeto ou ideia dos ídolos, aberração capital, originam-se em cadeia males de toda ordem, especialmente de ordem religiosa e moral chamada “a corrupção da vida” (Sb 14,12), pois ao pôr no lugar de Deus uma criatura, a ordem dos valores na vida se perverte, se perde o sentido moral. Com a mesma facilidade se passa de um conceito inadequado de Deus para sua negação, fenômeno bastante freqüente em nosso mundo moderno. A humanidade não se humaniza com o passo do tempo e sim com os valores éticos e morais. Os mais fortes ou aqueles que se sentem superiores aos demais são capazes de qualquer injustiça ou perversidade.

A idolatria não é coisa passada, dos tempos escuros e de civilizações primitivas. Os homens leva consigo os ídolos. Ídolos são puras criações do egoísmo, do medo, da insegurança, da soberba do homem que não encontrou seu centro ou seu norte.

2. As Obras Boas Que Realizamos São Testemunhas De Que Somos Seguidores de Cristo

O texto do evangelho de hoje é a continuação do texto do evangelho do dia anterior em que relatou a cura de um paralítico no Sábado. Os judeus da época criticaram Jesus que curou o paralítico, pois a cura aconteceu no Sábado que era o dia sagrado para eles. Dessa vez os judeus questionaram a autoridade de Jesus em fazer essa cura no dia de Sábado.

2.1. Jesus e Sua Autoridade Divina

Um dos problemas que o evangelho de João enfrenta é o da autoridade de Jesus questionada pelos seus adversários, porque Jesus não faz parte do grupo dos escribas, nem é da descendência sacerdotal, e sim vem de um lugar desconhecido, Nazaré. Mas o fundamento de sua autoridade está na sua comunhão plena com o Pai. O fruto desta profunda comunhão com o Pai é a sua preocupação em fazer o bem para os homens em qualquer circunstância e para qualquer pessoa. Somente tem autoridade quem faz alguém crescer. Somente tem autoridade quem pratica o bem. As palavras cheias de autoridade de Jesus e suas obras pelo bem de todos falam por si de que Jesus está em plena comunhão com o Pai. Quem pratica o bem normalmente fala menos de si, pois as obras falam mais por ele: “O ruído faz pouco bem, o bem faz pouco ruído", dizia São Francisco de Sales.  Quem pratica o bem é porque ele está em sintonia com o Bem maior, que é Deus, mesmo que ele não tenha consciência disso. "O bem é aquilo que dá maior realidade aos seres e às coisas; o mal é aquilo que disso os priva" (Simone Weil).

Quando nosso coração estiver duro ficaremos cegos diante das obras boas daquele que consideramos adversário. Se colocarmos o bem do homem acima de qualquer interesse, reconheceremos qualquer bem praticado por qualquer pessoa. A dureza de coração dos adversários de Jesus os leva a um ódio sempre crescente contra Jesus, pois eles se preocupam apenas com a própria gloria e o próprio interesse: “Como podereis acreditar, vós que recebeis glória uns dos outros e não buscais a glória que vem do único Deus?”. E o ódio dos escribas terminará no assassinato de Jesus. "Aquele que sem autoridade mata um criminoso, torna-se tão criminoso como este" (Blaise Pascal).  “Há pessoas que amam o poder, e outras que têm o poder de amar” (Bob Marley).

2.2. Testemunho Na Vida De Cristo E Na Vida Do Cristão

A cura do paralitico no Sábado (Jo 5,1-15) cria uma violenta oposição entre Jesus e os escribas que João descreve sob a forma de processo através do uso da palavra “testemunha/ testemunho”. No texto de hoje a palavra “testemunha/ testemunho” aparece, pelo menos, onze vezes.

Para Jesus, no evangelho de João, testemunhar equivale a manifestar o Pai, a revelar o Pai. O testemunho designa a função reveladora de Cristo e este testemunho tem como objetivo o próprio Cristo em seu mistério pessoal de Filho. Por isso, Cristo dá testemunho com toda sua presença e durante toda sua existência. Para Cristo, dar testemunho é revelar-se, dar-se conhecer: tudo o que é e de onde vem: do Pai. Se esta revelação termina na Cruz é porque na Cruz se opera a suprema revelação de Cristo, a saber: o amor supremo do Pai aos homens manifestado no amor supremo de Cristo aos seus (cf. Jo 13,1).

Jesus está “sozinho” para se defender. Logo seu testemunho ficaria sem validade nenhuma, pois a jurisprudência judaica determina: para que um testemunho seja válido são exigidas duas ou três testemunhas (Jo 5,31). Jesus apela para as obras pelo bem da humanidade. Essas obras mostram que Jesus está com o Pai e faz o que o Pai continua fazendo: “Meu Pai trabalho e eu também”. Logo sua testemunha mais válida é o Pai. Trata-se de um testemunho que se verifica nas obras e milagres (= sinais) que Jesus opera em favor da humanidade e não para a autopromoção.

Em relação à importância do testemunho o Papa João Paulo II escreveu na sua Carta Encíclica Redemptoris Missio no. 42:

·        O homem contemporâneo acredita mais nas testemunhas do que nos mestres, mais na experiência do que na doutrina, mais na vida e nos fatos do que nas teorias. O testemunho da vida cristã é a primeira e insubstituível forma de missão: Cristo, cuja missão nós continuamos, é a « testemunha » por excelência (Ap 1, 5; 3, 14) e o modelo do testemunho cristão. O Espírito Santo acompanha o caminho da Igreja, associando-a ao testemunho que Ele próprio dá de Cristo (cf. Jo 15, 26-27 ).

·        A primeira forma de testemunho é a própria vida do missionário, da família cristã e da comunidade eclesial, que torna visível um novo modo de se comportar. O missionário que, apesar dos seus limites e defeitos humanos, vive com simplicidade, segundo o modelo de Cristo, é um sinal de Deus e das realidades transcendentes. Mas todos na Igreja, esforçando-se por imitar o divino Mestre, podem e devem dar o mesmo testemunho, que é, em muitos casos, o único modo possível de se ser missionário.

·        O testemunho evangélico, a que o mundo é mais sensível, é o da atenção às pessoas e o da caridade a favor dos pobres, dos mais pequenos, e dos que sofrem. A gratuidade deste relacionamento e destas ações, em profundo contraste com o egoísmo presente no homem, faz nascer questões precisas, que orientam para Deus e para o Evangelho. Também o compromisso com a paz, a justiça, os direitos do homem, a promoção humana, é um testemunho do Evangelho, caso seja um sinal de atenção às pessoas e esteja ordenado ao desenvolvimento integral do homem.

Jesus quer nos dizer que para convencer os outros que realmente acreditamos em Deus temos que mostrar não com palavras e sim com as obras boas em favor dos homens. Não basta falar do amor, temos que aprender a amar especialmente através do perdão mútuo.

Além disso, Jesus quer nos ensinar a abrirmos nossos olhos e o nosso coração diante do bem que os outros podem fazer. Ninguém é exclusivo para fazer o bem. Ninguém pode encurtar a mão de Deus para fazer o bem. Somos convidados a reconhecer o bem praticado por quem quer que seja. Todos os cristãos devem fazer parte de um grupo: o grupo do bem. No seio da Igreja de Cristo não pode nem deve existir outro tipo de grupo. Ou você é de Cristo por se preocupar somente com o bem que deve ser praticado ou você não é de Cristo se você não se preocupa com o bem praticado. O bem não tem fronteiras. Deus pode usar qualquer ser humano para praticar o bem. Por isso, não podemos encurtar a mão de Deus. Quem pratica o bem é de Deus independentemente de quem quer que ele seja. Quem não pratica o bem não tem nada a ver com Deus, mesmo que alguém se considere cristão. Por isso, falar da é uma coisa. Falar da experiência de é outra coisa. Falar de amor é uma coisa. Falar amorosamente é outra coisa. Não basta não cometer algum crime ou algum mal, é preciso praticar o bem. Praticando o bem você afasta o mal e a felicidade é atraída. O bem praticado é o sinal da abertura diante do Bem Absoluto: Deus.

No evangelho de hoje Jesus reprovou seus conterrâneos por não ter escutado realmente Moisés: “Se acreditásseis em Moisés, também acreditaríeis em mim, pois foi a respeito de mim que ele escreveu”. Em Ex 32,7-14 Moisés reprova a atitude do povo, pois ao descer da montanha de Sinai, onde havia estado para falar com Deus, encontrou o povo adorando uma estátua de bezerro de metal.

O homem se rebaixa quando dá importância para as coisas, e gasta tempo para dar atenção maior para as coisas menos importantes que não edificam o ser humano. O homem se rebaixa quando ama as coisas e usa as pessoas em vez de amar as pessoas e usa as coisas. A adoração ao verdadeiro Deus através da vivência do amor fraterno é a única que não rebaixa o ser humano. “Quanto mais amas, mais alto tu sobes” (Santo Agostinho)

Quem procura a própria gloria e o próprio interesse será difícil saborear a convivência fraterna, pois haverá somente disputa e o jogo de interesse. O jogo de interesse para o próprio bem e não para o bem comum acabará com a comunidade. O homem se rebaixará, se ele der tanta importância às coisas mais do que às pessoas.  Quem não procurar a glória de Deus, mas, somente os próprios interesses e a própria glória, vai alimentar a própria vida com o ódio cada vez mais crescente contra os outros irmãos que não realizarem esses interesses. “Ali onde se destrói a comunhão com Deus, destrói-se também a raiz e o manancial da comunhão entre nós” (Bento XVI).

P. Vitus Gustama,svd

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